Órgão municipal incumbido de disciplinar o caótico trânsito de Salvador, como seu próprio nome indica, a Superintendência de Engenharia de Tráfego (SET) permitiu em suas dependências a montagem e funcionamento de uma máquina – outro nome não seria mais adequado – de arrecadação de multas.É isso mesmo, arrecadação. Pois que entre multar, quando for o caso, e arrecadar, como parece ser o propósito deliberado da SET, vai uma distância ética normalmente ignorada.
As notificações de transgressão no tráfego amordaçam o direito de defesa; acabam sujeitas a um esquema de indeferimento de recursos contra a multa aplicada.Ganham nessa transação injusta e sem retorno, porque de mão única, os cofres municipais. Penalizações múltiplas e até falsas de motoristas e proprietários de veículos se sucedem. A situação chegou ao ponto de, entre junho de 2007 e julho de 2008, provocar 23.796 pedidos de reconsideração de multas, 98,2% negados.
Somente 1,8% dos peticionários (429 motoristas) viram seu pleito atendido, entre os quais numerosos beneficiários por suas relações de parentesco na administração, que incluíam servidores da própria SET.
A mais do que suspeita diferença veio à tona em levantamento da Associação dos Servidores em Transportes e Trânsito do Município de Salvador (Astram), a qual, a julgar por sua composição, desfrutaria de situação privilegiada para o êxito de semelhante cometimento. Tudo isso perpetrado nos recessos do Conselho de Defesa e Autuação da SET, para onde convergem os recursos dos motoristas multados.O direito de defesa cria expectativas de deferimento, conforme o teor do arrazoado, mas, a julgar pelos resultados, a regra segue uma lógica centrada na recusa das apelações, por conseguinte em prol do aumento na arrecadação de multas, ao ponto de não ser anulada sequer a equivocada autuação de veículos. Houve até recomendação para que fossem rejeitados 21 mil recursos de vez, sem a devida análise.
Alertado pela denúncia, pelo absurdo dos números e desconforto que a situação lhe traz em momento eleitoral, o prefeito João Henrique demitiu de imediato, sem prejuízo de outras medidas saneadoras, o presidente do Conselho de Defesa e Autuação. Órgãos públicos atuam em defesa da coisa pública, mas também salvaguardam direitos dos cidadãos.
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