Prefeitura lança projeto para criar nova divisão de bairros na cidade

O professor de capoeira Marcelo Rocha, 29 anos, sempre morou na Rua Nova do Calabar, no bairro do Calabar. No entanto, sem nunca ter saído de lá, ele já residiu em outros quatro bairros.

Isso porque sempre que o carteiro entrega a correspondência em sua casa, o endereço diz uma coisa diferente. “Chega carta dizendo que o endereço é Avenida Centenário, Federação, Ondina e Jardim Apipema. É muito raro vir como Calabar”, conta.

Apesar disso, ele afirma que nunca se aproveitou da confusão para dizer que morava em outro lugar. “Tem gente que não tem firmeza para dizer que é do Calabar, mas aqui é bem melhor do que prédio”.

O problema é que, legalmente, o Calabar não existe. Pelo menos, é o que consta na atual delimitação de Salvador, que contabiliza apenas 32 bairros na cidade. Para tentar resolver a crise de identidade de moradores que não são como Marcelo, a prefeitura fez um mapeamento e pretende atualizar a contagem.

Segundo o coordenador das prefeituras-bairro, Reinaldo Braga Filho, o diagnóstico foi feito com o objetivo de reduzir uma lacuna histórica.  “O que nós temos são 32 bairros definidos por uma lei de 1960. Só que o nome para os bairros que usamos atualmente, no dia-a-dia são outros”, explica Braga.

Realizado com pesquisadores da Universidade Federal da Bahia (Ufba), IBGE e Conder, o estudo lista 160 bairros, dentro das 10 prefeituras-bairro criadas este ano, e será apresentado em forma de projeto de lei para a Câmara de Vereadores. “Isso vai ajudar na gestão pública, no trabalho das prefeituras-bairro com os órgãos executores de serviços à população”, explicou Braga.

Para a professora Elisabete Santos, do Centro Interdisciplinar de Desenvolvimento e Gestão Social da Ufba, uma das coordenadoras do mapeamento, é impensável que Salvador não tenha uma base de bairros atualizada. “Hoje a população não sabe com clareza os limites dos bairros. E isso é importante não só no sentido simbólico, mas também para a gestão da cidade”, enfatizou.

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Ser ou não ser – Reinaldo Braga Filho diz que nem todos os pretensos bairros se enquadram nessa definição, e podem ficar para futura atualização. “O Horto Florestal é um local que alguns consideram bairro, mas ainda não tem todos os critérios definidos pela Ufba para isso. Escada, no Subúrbio, é outro local que continua sendo uma localidade do bairro de Itacaranha”, exemplifica.

A professora Elisabete Santos explica que além da noção de pertencimento da comunidade, um bairro é definido pela sua capacidade de atração de serviços e autonomia, como escolas, serviços médicos e acesso a transporte público. Mas também tem relação com características urbanísticas e físicas, como a hidrografia e a topografia do local.

Por outro lado, bairros como Brotas devem ser divididos. Só este vai ganhar três vizinhos: Candeal, Vila Laura e Luiz Anselmo. Já a Cidade Jardim não deve ser promovida – por enquanto, fica no Candeal.

Contudo, quem mora ali diz que o bairro que não é bairro tem serviços melhores do que o oficial. A doméstica Rosilene de Jesus, 36, vive no Candeal, mas já disse que sua casa ficava na Cidade Jardim. Para ela, a mentirinha tem uma boa causa: tentar conseguir um táxi à noite. “Se eu disser que estou vindo para o Candeal, os taxistas não querem entrar”, revelou.

Os taxistas até admitem que evitam entrar em algumas áreas, mas reclamam dos clientes que agem como Rosilene. “Eles só dizem que moram no melhor”, critica o taxista Ivo Andrade, 43.

Moradores – Para o professor Ney Castro, do curso de Urbanismo da Uneb, a nova delimitação já deveria ter acontecido. “A ação deve ser pensada à medida que as pessoas começam a perceber as mudanças da cidade”. O professor advertiu porém que as medidas devem ser feitas em acordo com as necessidades da população. “Criar simplesmente uma delimitação não faz sentido. Só tem sentido se for instituído um pensamento de políticas públicas em algumas áreas”.

Segundo a professora Elisabete Santos, da Ufba, os moradores foram consultados. “Esse não foi um estudo feito do escritório. Houve consulta, que foi um importante indicador para a delimitação dos bairros”.

Da Freguesia da Sé, no século 16, aos 32 bairros da década de 60 – Já houve um tempo em que Salvador era uma só “Freguesia”: Sé ou Salvador. Isso em 1552. No ano de 1561 foi criada a freguesia de Nossa Senhora da Vitória. O crescimento populacional impulsionou a criação das divisões de Nossa Senhora da Conceição da Praia (1623), do Santo Antonio Além do Carmo (1646), São Pedro Velho (1679). No século 18, outras divisões foram criadas, sempre associadas à religiosidade. Só em 1911 começa a concepção de bairros, com a divisão de 11 distritos. Em 1938, os distritos passam a se chamar zonas.

Antes da atualização, em 1960, dos 32 bairros válidos até hoje. Em 1987 há o inicio da decentralização de bairros, Regiões Administrativas (RAs). “Tivemos as Administrações Regionais (ARs), que se transformaram, na gestão do ex-prefeito João Henrique, em SIGAs (Sistema Integrado de Gestão Administrativa). A implantação que estamos fazendo das prefeituras-bairros é uma concepção mais ampla, uma espécie de pequeno SAC Municipal. Que vai ter a incumbência de ver o dia-a-dia da comunidade e dialogar com os gestores municipais”, explica o coordenador das prefeituras-bairros Reinaldo Braga Filho.

Os 32 bairros de hoje:

Amaralina
Pituba
Rio Vermelho
Acupe
Cosme de Farias
Engenho Velho
Matatu 
Calçada
Uruguai
Saúde  
Bonfim 
Itapagipe 
Jardim Cruzeiro
Massaranduba
Monte Serrat 
Tororó  
Barbalho 
Cruz do Cosme 
Liberdade 
Pau Miúdo 
Quintas 
Fazenda Grande 
Lobato 
São Caetano 
Tanque da Conceição 
Barris 
Barra 
Canela 
Fazenda Garcia 
Federação 
Graça 
Ondina  

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